*Adriano Camargo Gomes
A pandemia do novo coronavírus e a crise que estamos presenciando deixam muito claro como as decisões do presente têm um impacto enorme em nosso futuro. A afirmação é evidente. Contudo, essa evidência esconde uma complexa e importante relação entre a realidade e os modelos científicos que usamos para tentar explicá-la e compreendê-la.
No domínio do direito antitruste, é frequente a utilização de modelos científicos para analisar aspectos relevantes da concorrência em um determinado mercado. A maioria desses modelos busca contribuir para a identificação do grau de concentração de um mercado em torno de poucos agentes econômicos, bem como do poder que esses agentes possuem para, individualmente ou em conjunto, influenciar esse mesmo mercado.
Ao analisar atos de concentração de empresas, como fusões e aquisições, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) costuma recorrer a esses modelos para tomar suas decisões. A análise realizada pelo Cade nesses casos consiste, fundamentalmente, em estabelecer uma comparação entre dois cenários do mercado: o cenário real, existente antes da concentração, e um cenário hipotético, de como o mercado seria após ela ocorrer.
Há mais de 15 anos, ou Cade autoriza diversos atos de concentração no mercado bancário, todos comprovadamente demonstrados pelos modelos de análise de atos de concentração (Santander-Real, Itaú-Unibanco e Bradesco-HSBC, para ficar em alguns casos). Atualmente, convém um cenário no qual os 5 principais bancos do país - dois deles pertencentes ao Estado - dominam mais de 80% dos ativos e depósitos bancários. Nos Estados Unidos, os 5 maiores bancos concentram menos de 50% do mercado.
Seria possível voltar a nossa análise de modelos, para falar de oligopólio e teorias econômicas que podem causar danos ocasionais no mercado bancário. Nosso objetivo, porém, não é explicado como falhas, mas apenas mostra o que é fácil de usar e parece com a realidade. E, falando dela, podemos ter certeza de que, caso algum modelo não indique falhas na concorrência do setor bancário, ou não somos capazes de entendê-lo ou, então, o modelo está errado.
Em um contexto de concorrência perfeita, como empresas vendidas por um preço igual ao custo de produzir mais uma unidade do seu produto. Em caso de bancos, boa parte do seu valor é respeito ao uso de dinheiro, pagando juros que costuma ser o próximo imposto básico (SELIC). Em outra ponta, os bancos vendem dinheiro em juros, esse é o seu "produto". Uma diferença entre SELIC e os juros que são pagos para os bancos de chamadas de spread bancário. Nosso spread é o segundo maior do mundo. Perdemos apenas para Madagascar.
Você pode justificar esse problema a partir dos altos índices de inadimplência e da baixa efetividade na recuperação dos créditos. Esse argumento, porém, cai por terra quando se constata que, mesmo nas crises econômicas ocorridas nos últimos 15 anos, nos bancos do mundo que causam danos ou prejuízos, os lucros dos bancos brasileiros não pararam de crescer. Das cinco empresas de capital abertas do país com maior lucro em 2019, quatro são bancos. A Caixa Econômica Federal só não está na lista porque não tem o capital aberto. Se estiver, ocupando o quarto lugar. Juntos, os cinco grandes bancos lucraram mais de R $ 100 bilhões no ano passado.
Mas não é só. Em março deste ano, o Banco Central anunciou medidas que injetaram R $ 1,2 trilhão no mercado, ampliando a liquidez dos bancos. Essa disponibilidade gigantesca de recurso, em um mercado competitivo, deve produzir maior oferta de empréstimos a juros menores - os Bancos disputando o mercado. Em razão da crise atual, ainda há uma expectativa de novas medidas, com disponibilidade de mais de R $ 600 bilhões. Nada disso parece ser suficiente. Qualquer empresário que precise de crédito para enfrentar uma crise já percebida: uma oferta que não aumentou e, aproveitando uma crise, os juros cobrados estão mais altos. O oligopólio dos bancos controla o mercado.A disponibilidade de recursos não impacta na curva de oferta, apenas não aumenta a demanda. Assim, com uma crise, os empréstimos ficam mais caros. Como se tudo isso não fosse suficiente,
O resultado é desastroso: comerciantes, industriais, agricultores, comerciantes e autônomos brasileiros, que movem o país por meio de produção e aquisição de bens e serviços, são estrangeiros por um mercado de crédito perverso. Um mercado que paga pouco pelo nosso dinheiro e que vende seu dinheiro mais caro do que quase todos os outros bancos do mundo. Um mercado que não conhece uma crise econômica que todos nós vivemos nos últimos anos e que, diante dela, ganha ainda mais dinheiro. Há muito tempo pagando, com juros, o preço das opções e dos modelos errados que não foram executados no passado. Não há economia que possa crescer se a produção e o consumo forem reduzidos de capital financeiro.Desta vez, em um contexto de crise, o preço que vamos pagar por esses erros será ainda mais alto. Os bons modelos mostram isso no futuro.
* Adriano Camargo Gomes , advogado, doutor pela USP, mestre pela Universidade de Oxford, professor da Escola de Direito e Ciências Sociais da Universidade Positiva.